terça-feira, 6 de novembro de 2012

Ela


Minha mãe sempre foi pra mim, frágil como um passarinho. Eu sempre olhava ela de longe, observava e sentia toda uma delicadeza e fragilidade, uma carência e necessidade de amor de todos os lados. Ela tem as mãos quentes, ela tem um abraço machucado. Sempre vi ela como uma pessoa pra eu cuidar, mais que ser cuidada por ela. Parecia que eu tinha nascido a mãe e que ela precisava de cuidado.

Minha mãe também sempre foi forte. Ela trabalhou duro, sofreu quieta, cuidou das duas filhas, voltou a morar com os pais, fez dar tripas coração, matou cachorro a grito, fez o que podia e não podia pra dar escola boa, sapatos novos, comida, carinho e amor pras duas filhas. Meu pai sempre falava que não sabia nem entendia como minha mãe conseguia fazer o que fazia. Nem eu.

Sempre quis pegar esse passarinho caído do ninho pra cuidar, mas nunca soube como. Sempre quis falar que ela nunca mereceu toda a dor que sentiu, mas nunca soube como. Sempre quis me desculpar pelas coisas mais absurdas e idiotas que a gente faz, mas nunca soube como. Se tem uma coisa que dói em mim é a falta que ela me faz.

Minha mãe cantava pela casa. Foi ela que me fez gostar da Gal, da Bethânia, da Adriana Calcanhoto, da Marisa Monte. Foi ela e a estante de livros de arte dela que me fez devorar e ler sobre Van Gogh, Picasso, Matisse, Frida Kahlo, Tarsila, Volpi. Foi ela que me fez ter vontade de sair da inércia, de trabalhar duro e muito, de querer desde sempre coisas melhores.

Minha mãe sempre foi linda, mas se encolhia na tristeza, dava pra ver. Hoje - e faz algum tempo já - minha mãe é feliz e muito mais linda. Não sei, mas imagino que ela continua cantando pela casa. Que ela continua preparando o café da manhã com frutinhas e iogurte. Que ela continua tomando chimarrão o dia inteiro. Que ela faz pausas pra se alongar de um jeito todo elegante. Que ela passa perfume antes de ir dormir. Tem vezes que eu só queria um abraço. Um colo, que ela fizesse massagem no braço com as mãos quentes. Minha mãe sempre foi pra mim muito do que quero ser.

(escrito no meio de lágrimas, fungadas e olhos borrados de saudades)

2 comentários:

Rafaella Coury disse...

Boniiiiiiiiiiito!
(saudade é uma merda. se um dia eu encontro o desgraçado que inventou isso, ele vai ver o que é bom.)

Anônimo disse...

Minha mãe viajará em dezembro, já faz um ano que estou fora de casa, ela nunca viajou em minha presença.
Alguns ciclos mudam, ela também já faz uma falta enorme aqui em meu coração. Nada comparada a saudade que você possui. Às vezes também tenho vontade de cuidar de quem me gerou.
Abraços.