domingo, 6 de março de 2011

citações pertinentes de um livro do acaso


Achei na livraria um exemplar lindo, encadernado, com a capa recoberta de tecido e impresso um padrão lindo, com aquelas fitinhas para marcar a página, verde-musgo, um luxo. O livro em questão é "O Falecido Mattia Pascal" de Luigi Pirandello, numa edição maravilhosa da coleção Clássicos da Abril Coleções, garimpado por apenas R$14,90. Me interessei mais pela maravilhosa composição gráfica do livro do que o possível conteúdo, ainda que a sinopse fosse claramente interessante. Eis que me surpreendo com várias coisas interessantes. Ei-las:

"Dependia apenas de mim: podia e devia ser o artífice do meu novo destino, já que a Sorte assim o quisera.
"Acima de tudo", dizia para mim mesmo, "cuidarei desta minha liberdade: passearei com ela por caminhos planos e sempre novos e jamais a vestirei com roupas pesadas. Fecharei os olhos e irei adiante quando o espetáculo da vida, em algum momento, apresentar-se desagradável. Procurarei de preferência as coisas que habitualmente chamamos de inanimadas e irei à procura de belas paisagens, de lugares amenos e tranquilos. Pouco a pouco, darei a mim mesmo uma nova educação, modificar-me-ei com o estudo paciente e dedicado para que possa dizer ao final que não apenas vivi duas vidas, mas que fui dois homens."" pág 102

"Dentro de nós, cada objeto costuma se transformar de acordo com as imagens que suscita e agrupa, por assim dizer, ao redor de si. Claro que podemos gostar de um objeto por ele mesmo, pelas muitas sensações agradáveis que nos proporciona, numa percepção harmoniosa, mas é bem mais frequente que o prazer que um objeto nos causa não se encontre no objeto em si. A fantasia o embeleza, envolvendo-o e iluminando-o de imagens caras. Nós não o percebemos mais como ele é, mas quase animado pelas imagens que cria em nós ou que os nossos hábitos lhe associam. No objeto, por fim, amamos o que colocamos de nós mesmos, o pacto, a harmonia que estabelecemos entre nós e ele, a alma que ele adquire somente para nós e que é constituída das nossas recordações." pág 120

"O mal da ciência, veja bem, senhor Meis, está em se ocupar apenas da vida.
- Sim - suspirei sorrindo -, já que temos de viver...
- Mas temos também de morrer! - rebatou Paleari." pág 143

"As almas têm um jeito especial de se compreender, de entrar em sintonia, de se tornar íntimas, ao passo que nossas personalidades encontram empecilhos na simples troca de palavras comuns, na escravidão das normas sociais. As almas têm suas necessidades e aspirações, que o corpo não entende quando é impossível satisfazê-las ou transformá-las em ação. Toda vez que duas pessoas se comunicam apenas com a almas, acabam por ficar sozinhas onde quer que estejam, sentem uma perturbação angustiada, quase uma repugnância violenta ao menor contato material, um sofrimento que as afasta e que acaba tão logo outra pessoa intervenha. Então, superada a angústia, as duas almas reconfortadas procuram-se e tornam a sorrir de longe." pág 161

"E o senhor Anselmo prosseguia, demonstrando que para nossa infelicidade nós não somos como a árvore que vive e não sente a si mesma, para quem a terra, o Sol, o ar, a chuva, o vento não parecem ser algo diferente dela: algo amigável ou nocivo. Nós homens, ao contrário, temos o cruel privilégio de nos sentirmos viver, o que resulta em grande ilusão: entendemos como uma realidade fora de nós esse nosso sentimento interior da vida, mutável e variável conforme os tempos, os acasos e o destino." pág 187

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